terça-feira, 21 de abril de 2009

Há muito que não sabemos o que acontece entre os muros da escola.

Entre les Murs leva a Palma de Ouro em Cannes.


Extraordinário o filme Entre os Muros da Escola de Laurent Cantet. Começar uma crítica com um elogio desses não é algo que recomendável, eu sei. Acaba-se por influenciar o leitor antes mesmo de apresentar os argumentos. Entretanto o filme francês merece tal crédito, não só por ser uma bela película, mas por denunciar, de uma vez por todas, a falência do sistema educacional. Há séculos que a fórmula é a mesma, claro que com algumas modernizações, mas a fórmula em si é a mesma. E o fato é que há tempos não funciona mais e Cantet mostra isso com perfeição em seu filme.
François é um professor de Francês em uma escola na periferia de Paris que se depara com um problema cada vez mais comum; a insolência dos alunos e a falta de vontade que os mesmos tem de aprender e estudar. O professor é cheio de boas intenções e boa vontade, mas tem muita dificuldade em captar a atenção de seus alunos, que além de não se interessarem não tem a menor preocupação em demonstrar respeito ao mestre. François passa por situações muito difíceis como perder completamente a paciência com algumas alunas ou ter que expulsar alunos da classe. Ao mesmo tempo demonstra muita preocupação com seus alunos conversando com os pais e tentando de tudo ao seu alcance para que eles tenham o melhor aprendizado possível. O cenário fica ainda mais complicado por se tratar de uma escola típica da periferia parisiense com uma mistura étnica e religiosa muito grande, mas não que isso seja o grande problema apresentado por Cantet.
O fato é que não importa o quanto François ou seus colegas tentem, o sistema é falido, a fórmula não funciona mais e o destino é a ladeira abaixo, caso nada seja feito. Na escola suburbana eles até que tentam algumas inovações, como um bizarro sistema de pontos para estudantes de mal comportamento, que obviamente não funciona. O grande problema na realidade é a falta de interesse dos estudantes, falta de interesse esta que leva a falta de respeito aos mestres que por fim leva ao péssimo comportamento. Ora, como podemos ter respeito por alguém que nos ensina algo que não nos interessa? Aliado a isso, o sistema é punitivo e injusto, pune-se sempre, premia-se pouco e a justiça é feita da mesma forma que na idade média; no caso de uma briga, todos são culpados, sem julgamentos.
O ensino deve ser encarado como uma forma de arte, aliás não deve ser encarado, o ensino é uma forma de arte. Lecionar é como atuar, a sala de aula é como um teatro. Existem expectadores e artistas. E o artista tem a obrigação de convencer e entreter sua platéia. "Como assim, entreter?" Muitos dirão, "Isso é escola e não diversão!" Claro, e é com esse pensamento que vamos perder milhares de jovens brilhantes por não sabermos como lidar com a juventude de hoje. Todos já fomos crianças um dia e sabemos hoje que nada sabíamos então. Como é que podemos afirmar que as crianças devem saber se portar e se interessar por química ou física?
O mundo mudou muito, a informação e o entretenimento modificaram demais os hábitos e gostos da população. Hoje temos TV, internet, cinema, teatro e todas estas formas de transmitir informação estão em constante modernização da linguagem, com profissionais e artistas sempre criando novas formas, mais interessantes, mais agradáveis e mais didáticas de transmitir seus pensamentos, idéias, convicções e até produtos consumíveis. No entanto o sistema de ensino não acompanha essa evolução da linguagem e as crianças, se de um lado recebem informações da indústria cultural de uma forma muito sedutora, do outro continuam a assistir aulas da mesma forma que no século XV. Cabe aqui ser pragmático. Podemos barrar a evolução da indústria cultural? Então, pelo amor de deus, reformemos o sistema educacional.
Minha proposta é, como dito anteriormente, mudar o conceito da sala de aula. É transformar a sala de aula em um lugar aspiracional, aonde o professor deve assumir uma função muito mais importante. Ele deve ser um mestre-artista, deve ser focado em captar a atenção dos alunos, em desvendar os interesses e talentos de cada um e incentivá-los a investir nesses talentos. A quantidade de matéria deve ser menos importante do que a formação da pessoa. As notas devem ser menos importantes do que a descoberta de si mesmo. A aula deve ser um teatro onde de alguma forma todos vamos nos identificar com algum personagem, assim como fazemos no cinema. Se continuarmos a culpar os alunos, vamos entrar num beco sem saída, pois não podemos vencê-los e eles são o nosso futuro.





Títulos Original: Entre les Murs.
Duração: 128 min.
Diretor: Laurent Cantet.

Roteirista: François Bégaudeau, Robin Campillo e Laurent Cantet.

Elenco: François Bégaudeau, Nassim Amrabt, Cherif Bounaidja, Juliette Demaille, Dalla Doucoure, Arthur Fogel, Damien Gomes.